E falou-lhe de muitas coisas por parábolas, dizendo: Eis que o semeador saiu a semear.
E, quando semeava, uma parte da semente caiu ao pé do caminho, e vieram as aves, e comeram-na;
E outra parte caiu em pedregais, onde não havia terra bastante, e logo nasceu, porque não tinha terra funda;
Mas, vindo o sol, queimou-se, e secou-se, porque não tinha raiz.
E outra caiu entre espinhos, e os espinhos cresceram e sufocaram-na.
E outra caiu em boa terra, e deu fruto: um a cem, outro a sessenta e outro a trinta. – Mateus 13:3-8
Bem vindos à parábola do semeador. Essa é uma das minhas parábolas favoritas por diversas razões, entre as quais por ser uma das mais didáticas e simples, mostrando as diversas realidades pelas quais uma pessoa pode passar ao receber o evangelho, segundo porque foi uma das poucas, senão a única que Jesus se deu o trabalho de explicar.
Esse texto em particular, se continuarmos lendo um pouco além do que colei acima, veremos os discípulos perguntando justamente o porquê de Jesus ensinar através de parábolas e Ele mesmo responde que “os mistérios do reino dos céus” só são dados a conhecer aos discípulos, seguidores, filhos de Deus, ou seja, muitos terão acesso à Palavra, mas poucos é que verdadeiramente compreenderão o sentido, tirando lições de vida de um texto que de outro modo seria mera letra fria. Além disso, Jesus falava através de parábolas para que se cumprisse a profecia do Salmos 78:2, conforme mais adiante o verso 35 desse mesmo capítulo que estamos estudando vai dizer (lembre-se que o evangelho de Mateus é escrito com foco nos judeus, e por esta razão o autor se detém repetidas vezes a dizer o que e o como a vida de Jesus e sua obra eram cumprimento das diversas profecias feitas a seu respeito no Antigo Testamento, que era a “Bíblia” dos judeus).
Mas, dado o contexto, vamos ao texto e à mensagem. Nos versos seguintes, de 18 a 23, Jesus explica a mensagem, então, como irei me basear em ambos, segue abaixo o sentido original daquilo que quem contou a estória quis dizer:
Escutai vós, pois, a parábola do semeador.
Ouvindo alguém a palavra do reino, e não a entendendo, vem o maligno, e arrebata o que foi semeado no seu coração; este é o que foi semeado ao pé do caminho.
O que foi semeado em pedregais é o que ouve a palavra, e logo a recebe com alegria;
Mas não tem raiz em si mesmo, antes é de pouca duração; e, chegada a angústia e a perseguição, por causa da palavra, logo se ofende;
E o que foi semeado entre espinhos é o que ouve a palavra, mas os cuidados deste mundo, e a sedução das riquezas sufocam a palavra, e fica infrutífera;
Mas, o que foi semeado em boa terra é o que ouve e compreende a palavra; e dá fruto, e um produz cem, outro sessenta, e outro trinta. – Mateus 13:18-23
Vamos então à mensagem que Deus trouxe ao meu coração, que espero abençoe a vida de vocês também.
“O semeador” somos cada um de nós, filhos de Deus que saímos a cumprir a grande comissão, nosso chamado e ordenança da parte de Jesus, conforme Mateus 28:19,20, de proclamar a mensagem de amor em que Cristo morreu por nós na cruz do Calvário sendo nós ainda pecadores e seus inimigos (Romanos 5:8). Alguns poderiam dizer que o semeador é o próprio Deus, mas não penso desta forma, primeiro porque entendo que quem envia o semeador a semear, quem lhe dá as sementes, quem controla as condições climáticas para que a semente possa nascer, a Esse sim podemos dar a responsabilidade que Deus tem no processo, ou seja, Ele que dá a Palavra e Ele convence os corações do pecado, da justiça e do juízo através do seu Espírito Santo (João 16:8), e segundo porque se Deus fosse o semeador, qual seria nossa responsabilidade? Também não entendo que seja esse o trabalho dos anjos, senão no próprio capítulo 13 de Mateus, logo depois dessa parábola, Jesus não falaria a respeito da parábola do joio e do trigo, onde a função dos anjos é bem clara, não semear, mas de ceifar, colher os frutos da semeadura.
Mas continuando, vemos o primeiro versículo que diz que o semeador saiu a semear. Aqui temos a primeira lição “oculta” nesse texto que é que o semeador precisa sair de onde está para plantar. Ninguém que planta faz isso dentro de casa, não faz sentido. A casa da gente pode até ter um pomar, mas se queremos ter frutos em quantidade e qualidade devemos ir até o local adequado, o terreno já preparado, devidamente arado e só então faremos o plantio. Isso me lembra a analogia que Jesus Cristo faz onde nos chama de pescadores de homens, e nenhum pescador que se preze irá pescar numa poça formada depois de uma chuva, mas sim num lago, rio ou lagoa, ou mesmo no mar, para onde precisará se deslocar até determinado local onde a pescar será mais frutífera. Precisamos, então, sair de nossas casas, de nossa zona de conforto, nos colocarmos à disposição de Deus para que Ele nos envie para trabalhar onde Ele mesmo sabe que será mais necessário.
A segunda lição que tiramos desse texto, vemos no verso seguinte que diz que quando semeava, parte das sementes caiu à beira da estrada, e vieram as aves e as comeram. Imediatamente me veio à mente lembranças de quando era garoto e viajava com minha família pelo interior e via milho plantado à beira da estrada, longe de qualquer outra plantação, às vezes em uma encosta, ou seja, em um terreno que não estava preparado para receber aquela planta e então fiquei pensando em como deveria ser difícil colher os frutos naquelas condições, até para conseguir chegar aquele local deveria ser penoso a quem quer que fosse colher aquele milho. Além disso, a beira da estrada é meio que terra sem dono, qualquer pessoa pode ir lá e fazer o que quiser com aquela planta, e talvez o esforço desprendido para plantá-la seja em vão se alguém colher o fruto em seu lugar, ou mesmo se alguma máquina vier e arrancar aquela planta quando a estrada estiver em manutenção. Meditando aqui nesse versículo pensei nas pessoas que ouvem falar do evangelho meio que “sem querer”, despretenciosamente, seja pelo testemunho de alguém que falava a um terceiro, ou mudando de canal na televisão e ouvindo por alguns instantes o pregador falar sobre algo da Palavra, ou seja, não é verdadeiramente a semente sendo plantada, é o “resto” que caiu sem querer da bolsa do semeador e que não poderíamos esperar que dali nascesse uma planta. Por último vemos ainda que as aves vieram e comeram as sementes. É até meio óbvio se analisarmos tudo que falamos acima, ora veja: 1) a semente caiu “ao acaso” e não foi efetivamente plantada, 2) na beira da estrada, e não no lugar adequado. Não teria outro fim possível que não que a semente se perdesse ou animais a comessem. Assim também acontece na vida de pessoas que tem algum contato breve e momentâneo com a Palavra mas essa não encontra lugar em sua vida preparado para ser plantada, criar raízes, ser protegida de “aves” que porventuram queiram se alimentar daquilo, arrancando o que poderia frutificar em seu coração. É interessante que Jesus fala que o maligno arrebata a Palavra do coração, e o que entendo é como se a pessoa que recebe “palavras fora do contexto”, de qualquer jeito, muitas vezes o inimigo dá um jeito de torcer a “palavra” de tal modo que a pessoa pega é aversão ao evangelho.
A terceira lição que retiramos desse texto é das pessoas que recebem a Palavra com alegria, entendem o que ela significa, mas, por não possuírem raízes, logo que vem a provação se escandalizam e desistem, se afastam do convívio dos irmãos. Lembro-me das experiências que fazíamos quando crianças de fazer um grão de feijão germinar em um chumaço de algodão embebido em água. O feijão possui um pouco de alimento necessário para a planta crescer de sua semente dentro de si mesmo, mas a partir que esse estoque acaba, se a planta não tiver fixado suas raízes em solo fértil, ela irá murchar e morrer. Muitos de nós somos assim, recebemos a Palavra inicialmente mas não nos aprofundamos nesse relacionamento com o Pai, não O buscamos em oração, não “comemos” da Palavra então esse primeiro amor que nasceu em nós acaba murchando e morrendo. Isso me lembra também de que às vezes a plantinha quer fixar raízes e vem alguém e tira, botando de volta no chumaço de algodão. É como um novo convertido que chega na igreja e se depara com péssimos testemunhos de irmãos na fé que, “do alto” de seus muitos anos de caminhada, já não mais deveriam ter determinado tipo de comportamento, ação ou atitude que esse novo irmão, pela inexperiência, talvez não consiga lidar, e talvez passe a considerar tudo aquilo como uma grande hipocrisia. Uma outra coisa que penso quando vejo esse versículo é quando ele fala sobre angústia e perseguição por causa da Palavra. Ora, eu mesmo já cansei de ser perseguido, ridicularizado etc por que sou cristão, porque creio na mensagem do evangelho e nas Escrituras. Mas eu sou “macaco velho”, a pele das minhas costas já está um pouco mais grossa de tanta cipoada, mas imagine uma criança pequena levando uma surra de cinturão, as marcas são tão fortes, a dor é tão intensa que ela corre, foge para longe de tudo aquilo. O novo convertido que não encontra o apoio de sua família, de seus amigos, e pior, nem dos irmãos que deveriam lhe receber de braços abertos, dificilmente aguentará a barra que é os primeiros passos de caminhada na fé e logo acabará desistindo.
A quarta lição, e que para mim é a que mais fala, particularmente, é a que vemos com relação aos espinhos. Aqui a planta nasce, cresce, desenvolve-se parcialmente mas chega determinado momento em que não consegue dar frutos. Vejo aquelas plantas que crescem junto a outras e que se enroscam nelas meio que sugando sua energia, tapando-lhes o sol, impedindo-as de realizar por completo o propósito para o qual foram criadas e plantadas. Pior do que isso são os espinhos, pois aqui além da planta se sentir sufocada, ela é literalmente machucada. Trazendo para nossa realidade, muitos de nós recebemos a Palavra, aceitamos a Cristo como Senhor e Salvador de nossas vidas e caminhamos em um relacionamento pessoal consigo, mas não conseguimos transmitir o seu amor, passar esse relacionamento do plano vertical para o horizontal porque muitas vezes sentimos medo do que vão pensar de nós, ou talvez a pressão no meio que vivemos, trabalhamos, estudamos seja tão grande que as vezes nos sentimos como pequenos peixes nadando contra a maré. Cansamos ao ponto de quase desfalecer. Pior do que as adversidades, aqui temos os cuidados dessa vida, ou seja, as preocupações com coisas e circunstâncias que o próprio Senhor nos disse para não nos preocuparmos (Mateus 6:25-34), porque muitas desses coisas não são necessariamente ruins, ao contrário, muitas são boas e necessárias. Vejo também aqui a questão do foco, para onde estamos olhando, qual tem sido a nossa prioridade, se no Senhor, ou nas coisas, naquilo que as pessoas pensam de nós. Será que nós somos os “quadrados” ou preferimos tomar aquela cervejinha, ir para a balada com a galera só para sermos aceitos (e olhe que não vou entrar no mérito de ser pecado ou não, pois pra mim isso vai muito além de mero “pode” ou “não pode”, mas sim “devo” ou “não devo”, “edifica” ou “não edifica”). A Bíblia diz nesse mesmo texto de Mateus 6 que onde estiver nosso tesouro, ali também vai estar o nosso coração portanto pare agora mesmo e reflita, onde está o seu tesouro? Está no seu emprego, carreira, bens, fama, namorada(o), amigos, carro, dinheiro, família, pastor, em você mesmo, ou em Cristo? Lembre-se da planta entre os espinhos, sufocada, sem ar, sem conseguir crescer o suficiente nem desenvolver-se de modo a cumprir o plano de Deus para ela, assim somos nós quando baixamos os nossos olhos da cruz de Cristo e passamos a nos preocupar mais com a nossa vida e nossa história. E digo mais, resista a tentação de pensar em você como uma “mera” planta se você está sem frutos, pois nós fomos plantados para dar fruto, e muito fruto. A Palavra com relação a isso traz um forte alerta em Lucas 3:9:
E também já está posto o machado à raiz das árvores; toda a árvore, pois, que não dá bom fruto, corta-se e lança-se no fogo. Lucas 3:9
Essa palavra é bem clara, só as plantas sadias e frutíferas são dignas de permanecerem, o resto só consome recursos sem produzir resultado, é retirado do meio das produtivas para que estas passem a produzir ainda mais.
A quinta lição refere-se ao último versículo, que fala da semente bem plantada, em solo fértil, irrigada, e que no devido tempo produz seu fruto. Essa é uma lição que fala sobre pessoas que se dispoem a viver uma vida de integridade com o Pai e com seus semelhantes. Note que nem toda semente irá produzir a mesma quantidade de frutos, algumas produzirão cem, outras sessenta, outras trinta, mas o importante aqui não é nem tanto quanto produzem, mas se produzem. Quando o semeador planta, o máximo que cabe a ele é preparar o terreno, plantar, cuidar para que não apareçam fungos e outras pragas, irrigar e depois esperar que, no tempo devido, irá colher os frutos. A quantidade de frutos que virá de cada semente foge ao seu controle e ao seu conhecimento. Por outro lado uma coísa é certa, nesse contexto, observados esses cuidados, a planta irá frutificar, e mesmo que trinta vezes mais, que é o mínimo que esse texto fala (ainda que não seja um número fixo), vemos que a proporção da colheita é bem maior do que o que foi investido. Aqui não vou ceder à tentação de muitos hoje em dia que falam para darmos nosso dinheiro para pastor ou igreja A ou B e depois ir cobrar de Deus que nos dê trinta, sessenta ou cem vezes mais. Não, mas pense comigo se investirmos em vidas, tenho absoluta certeza que Deus terá prazer de nos dar esse tipo de “retorno” também em vidas, trinta, sessenta ou cem vezes mais! Não seria maravilhoso?
Aqui cabem algumas considerações para refletirmos:
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que tipo de solo tem sido o seu coração? Beira da estrada, terra seca e pedregosa, em meio a espinhos ou solo fértil? Será que você tem se colocado para receber a Palavra de Deus de modo que ela brote, firme suas raízes de maneira profunda já em preparação para a enorme árvore que virá a tornar-se em sua vida?
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que tipo de semente tem sido lançada em seu coração? Sementes de generosidade, alegria, paz, amor, fé, resultantes de um relacionamento pessoal com nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, ou sementes de amargura, de desejos pecaminosos e egoístas, de ganância, vaidades e ambição descontrolada? Lembre-se dos textos de Gálatas 6:7,8 e Mateus 7:17,18 que diz que daquilo que plantarmos certamente colheremos, afinal não podemos plantar coisas más e esperarmos receber boas, e vice versa.
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você tem esperado o fruto do seu trabalho? Perceba, o semeador saiu para semear, mas a história não termina aqui. Quem planta espera a paga pelo seu trabalho, mesmo que seja na participação dos frutos obtidos. No entanto, toda lavoura demora para produzir. Algumas plantas têm o ciclo de produção mais rápido, outras mais demorado então lembre-se disso quando estiver para esmorecer pois não consegue ver os frutos da sua obra. Hebreus 11:13 nos mostra, ao final da galeria de heróis da fé, que eles partiram sem terem visto o resultado final de seu investimento em fé e isso é o que muitas vezes acontece nas nossas vidas. Investir em pessoas, em vidas, não é normalmente um retorno a curto prazo, mas esse retorno, ainda que não o alcancemos com nossos olhos, terá valido a pena.
Uma última lição, para concluirmos, eu devo admitir que escutei num trecho do Talmidim 178, blog em vídeo do Pr. Ed René Kivitz, que fala que cada um de nós, em determinado momento de nossas vidas, possuímos o coração como algum tipo de semente e solo acima descritos, ou seja, haverá períodos em que nos encontramos como aquela semente caída na beira da estrada, alvo de predadores e sem condições sequer de viver; outros em que estamos na terra seca, mal sobrevivemos, mas falta a água do Espírito em nossas vidas de modo que acabamos morrendo de sede, de inanição; ainda alguns em que parece que tudo vai bem, mas tão bem que passamos a nos preocupar com o excesso de coisas que temos de possuir, cuidar, fazer, e nos esquecemos do principal, que é a nossa vida, nosso relacionamento com o Pai e com outras pessoas; e, finalmente, um período em que nos colocamos à disposição do Pai, somos plantados, cuidados, e permanecemos aguardando que venham os frutos. O importante então é percebermos em que fase nos encontramos, e sabermos onde deveremos chegar. Não é sábio nos encontrarmos em qualquer das estações anteriores à de plena capacidade e desejarmos permanecer desse jeito. Tem uma música que gosto bastante que diz que “Deus me ama como sou, mas não me deixa como estou” e isso deve ser uma verdade e uma realidade em nossas vidas a cada dia.
A Palavra de Deus é essa semente que é plantada no solo do nosso coração. Como eu e você temos recebido essa semente? Com displicência, como se tivesse caído à beira do caminho? Com alegria fugaz, sem embasamento na Palavra, vivendo de emoções que rapidamente se esvaem e não sobrevivem ao primeiro choque de realidade e vão para lá e para cá, inconstantes, com qualquer vento de doutrina? Com excesso de preocupação com as coisas desta vida, de modo que as riquezas prendem nossa atenção de tal modo que não conseguimos viver o evangelho em sua plenitude? Ou com coração sincero em um relacionamento de raízes profundas, onde não seremos chacoalhados pelo vento, onde podemos alcançar água em meio à terra mais seca, onde podemos obter estabilidade para crescer acima dos espinhos que porventura tentem nos sufocar, de modo que nossas folhas cheguem aos lugares altos, onde podemos respirar tranquilo, e mais importante, frutificarmos para abençoar a vida daqueles que estão ao nosso redor?
Seja em que momento da caminhada você e eu estivermos, o importante é mantermos nosso foco em Cristo, caminhando com Ele nessa preparação. Um dia somos essa semente que vira árvore. Noutro dia somos o semeador que lança a semente em busca de colher frutos como resultado em muito mais vidas.
Deus nos abençoe.